RPS: a importância da testagem e das evidências para orientar políticas públicas de combate à pandemia
O Brasil é o país que menos testa entre as 20 nações com maior taxa de óbitos da doença em todo o mundo. Não realiza testes suficientes para identificar a proporção de brasileiros que já manteve contato com o vírus. Grande parte dos estados publica dados sem padronização ou incompletos.
Estas são duas conclusões alarmantes da Nota Técnica 13 – Estratégias diferenciadas e falta de padrão nas testagens dificultam o enfrentamento da pandemia, enfraquecem decisões de flexibilização e aumentam a insegurança da população, da Rede de Pesquisa Solidária (RPS). O material é recomendado pelo FGV EESP Clear no repositório do Monitor de Evidências Covid-19 – clique aqui para acessar a íntegra.
Após aprofundar estudos sobre as políticas de testagem nas esferas federal, estaduais e municipais do Brasil, a RPS constatou que estratégias diferenciadas e falta de padrão nas testagens dificultam o enfrentamento da pandemia, enfraquecem as decisões de flexibilização e aumentam a insegurança da população.
O boletim mapeou informações sobre testagem de covid-19 e identificou a diferença entre os tipos de testes realizados, a imprecisão das informações apresentadas pelas Secretarias Estaduais de Saúde (SES) e a cobertura da testagem realizada no Brasil e em seus estados.
A capacidade de realização de testes em massa sustenta dois dos três critérios apontados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para a flexibilização: quando há indicação de que a epidemia está controlada; quando o sistema de saúde é capaz de atender uma ressurgência de casos; quando o sistema de vigilância é capaz de identificar novos casos e seus contatos.
A orientação é que a taxa de resultados positivos entre os testes realizados não deve ultrapassar 5% durante ao menos 14 dias. A OMS também recomenda que seja feito o rastreamento de todos os que tiveram contato com pessoas infectadas para que sejam orientados e mantidos em quarentena.
Entretanto, aponta o levantamento, a média de positividade dos testes no país foi de 36% em junho de 2020. Somente sete estados apresentaram taxa inferior a 20% no mesmo período, sendo que nenhuma unidade federativa chegou próximo aos 5% recomendados pela OMS.
Além disso, as plataformas oficiais das SES e os boletins estaduais apresentam dados muito diferentes e despadronizados. “Os estados do Mato Grosso e Paraná apresentam somente os testes RT-PCR realizados, enquanto quatro outros estados não informam qual o tipo de teste foi realizado e sete estados não registram o número de testes em suas plataformas estaduais”, pontua a nota técnica.
Como informação é um subsídio relevante a gestores públicos ocupados com a pandemia, o material da RPS também traz uma elucidativa tabela detalhando os três principais tipos de testes realizados para diagnóstico e rastreamento da covid-19, como, quando e em que casos devem ser feitos: o RT-PCR, do inglês reverse-transcriptase polymerase chain reaction, considerado o “padrão ouro” de testagem pela OMS; o teste sorológico; e testes rápidos de antígenos e anticorpos, utilizados no rastreamento e disseminação do vírus.
Segundo o levantamento, uma estratégia eficaz de combate à disseminação da pandemia deveria evidenciar a utilização tanto de teste de RT-PCR, que permite que os infectados sejam identificados e adotadas as medidas de isolamento da pessoa infectada, quanto de testes rápidos, para o rastreamento da doença e análise da evolução da pandemia.
Entretanto, “somente 13 estados brasileiros apresentam o número total de testes realizados diferenciando seu tipo. Paraná e Mato Grosso apresentam somente os números referentes aos testes RT-PCR realizados, enquanto os 11 outros não especificam o tipo de teste realizado.”
Entre os estados que apresentaram o número de testes realizados o estudo identificou duas estratégias adotadas: monitoramento de infecção ativa (predomínio de testagem por RT-PCR); e rastreamento de contato prévio da população com o vírus (predomínio de testagem por teste rápido). A nota técnica traz ainda um gráfico comparando a ênfase dada para cada estratégia desenvolvida pelos estados que apresentaram o número de testes realizados segundo a tipologia.
“Há estados em que predominam os testes rápidos, como Amazonas, Piauí e Ceará, onde pode ocorrer déficit de testagem de pessoas com infecção ativa e alta probabilidade de transmissão da doença, colocando em risco iniciativas de políticas públicas para o controle da pandemia. Há outros estados em que há predominância dos testes RT-PCR, como Sergipe, Espírito Santo e Mato Grosso do Sul. Nestes pode haver desconhecimento da proporção de moradores que já teve contato com o vírus, prejudicando a tomada de decisão sobre flexibilização do distanciamento em virtude do comprometimento da análise dos gestores locais, que podem subestimar os riscos frente à pandemia”, alerta o boletim.
As conclusões da RPS no material são preocupantes. Destacam que a falta de padrão nas mensurações, testagens e na definição de estratégias realça o debate sobre a descoordenação nacional e os riscos evitáveis. “O nível de informação sobre testagem por parte das SES é muito baixo. Além da ausência de estimativas sólidas sobre o número de infectados, a falta de informação reforça a confusão sobre as medidas adequadas de distanciamento físico que os estados devem adotar”. Tendo isso em vista, é fundamental o acesso às informações que devem orientar tanto as políticas de distanciamento físico quanto as iniciativas de afrouxamento dessas mesmas políticas.
Visite a página do Monitor de Evidências Covid-19 e confira na íntegra este estudo do Banco Mundial e outras dezenas de conteúdos qualificados sobre políticas públicas baseadas em evidências no contexto da atual pandemia. O FGV EESP Clear assina a curadoria desse projeto.