“A avaliação participativa pode ser aplicada em todo o ciclo da política pública”
Carolina Proietti Imura
Nicole Mourad Pereira
Embora existam condições favoráveis e premissas mínimas desejáveis, não há um “cenário ideal” para decidir incorporar múltiplos atores na avaliação de políticas públicas.
Assim defende a economista mexicana e professora da Universidade de Guadalajara, Mónica Ballescá. Por mais de 12 anos, foi diretora-geral de planejamento, monitoramento e avaliação na Secretaria de Planejamento e Participação Cidadã (anteriormente Secretaria de Planejamento, Administração e Finanças) do Governo de Jalisco.
Nesta conversa com o blog do FGV CLEAR, Mónica fala das particularidades da avaliação participativa. Confira:
FGV CLEAR – Como você define a avaliação participativa e quais características a diferenciam de outros tipos de avaliação?
Mónica Ballescá – A avaliação participativa pode ser compreendida tanto como uma perspectiva metodológica quanto como uma prática de gestão pública. Do ponto de vista metodológico, especialmente sob uma abordagem sistêmica, trata-se de um modo de conduzir o processo avaliativo por meio de ferramentas, técnicas e estratégias que asseguram a participação ativa, contínua e com poder de influência dos diversos atores en
volvidos no desenho e na implementação do projeto, programa ou política pública avaliada.
Assim, é um processo de avaliação sistemática que, sem abrir mão do rigor técnico, incorpora mecanismos participativos em diferentes — ou todas — as etapas da avaliação: definição, planejamento, investigação e uso dos resultados.
Alinhada ao princípio de “não deixar ninguém para trás”, a avaliação participativa favorece o uso mais amplo e eficaz das avaliações. Ela cria condições de aprendizagem e apropriação dos resultados que transformam os atores envolvidos em agentes de mudança, capazes de dialogar, negociar e contribuir para soluções mais sistêmicas diante dos desafios complexos enfrentados pela sociedade.
Quais critérios ou fatores você considera essenciais para decidir quando uma avaliação deve ser participativa, com base na sua experiência?
Embora existam condições favoráveis e premissas mínimas desejáveis, não há um “cenário ideal” para decidir incorporar múltiplos atores na avaliação de políticas públicas. É uma escolha que exige consciência de que se enfrentará situações desconhecidas em comparação com processos avaliativos tradicionais.
Na experiência do estado de Jalisco (México), a adoção da perspectiva participativa exigiu formação técnica, vontade individual e decisão coletiva para criar soluções criativas diante de contextos desafiadores.
Fatores que favorecem a realização de uma avaliação participativa:
- Motivação e comprometimento dos envolvidos: É fundamental que tanto os gestores da avaliação quanto os operadores do programa estejam convencidos e determinados a participar. Isso cria um ambiente colaborativo, facilita o fluxo de informações e favorece a implementação de melhorias.
- Democratização do conhecimento técnico: Tornar a linguagem da avaliação acessível a todos é essencial. Ao capacitar atores não familiarizados com o tema, amplia-se a participação e a qualidade da contribuição de diferentes perfis: técnicos, usuários, beneficiários, organizações intermediárias e avaliadores externos.
- Criação de espaços abertos e colaborativos: Avaliações participativas exigem tempo, escuta ativa, empatia e abertura para decisões compartilhadas. A ideia é passar do “eu e você” para o “nós”, valorizando os saberes diversos que cada ator traz para compreender e solucionar problemas complexos.
- Compreensão da intervenção como sistema interconectado: A avaliação deve considerar que os resultados desejados só são possíveis com a contribuição de múltiplos atores conectados.
- Foco em intervenções que demandem entendimento aprofundado: Avaliações participativas são mais adequadas para programas que não necessitam de respostas urgentes, mas sim de aprofundamento no aprendizado.
- Programas em fase de consolidação: Idealmente, a avaliação participativa deve ser aplicada a políticas já implantadas ou em expansão, com menor risco de descontinuidade. Em Jalisco, um programa teve seu objetivo completamente alterado após uma mudança de governo, tornando parte dos achados da avaliação irrelevantes para a nova gestão.
Alguns críticos argumentam que avaliações participativas são mais caras, levam mais tempo e têm menor rigor metodológico. Qual é sua opinião?
De fato, a avaliação participativa requer mais tempo do que uma avaliação tradicional — mas não é um tempo “eterno” ou paralisante. Em Jalisco, realizamos cinco avaliações com mecanismos participativos em todas as fases (seleção, planejamento, investigação e uso). Em média, cada uma levou cerca de 1 ano e 8 meses do início à implementação das agendas de melhoria (recomendações).
Algumas razões para esse tempo maior:
- As avaliações ocorreram durante a pandemia de COVID-19 (2019–2022).
- Contratamos um facilitador externo por falta de experiência prévia da equipe em processos participativos.
- O processo de contratação de avaliadores externos foi moroso e complexo, levando de 3 a 6 meses.
- As avaliações foram “multifuncionais”, respondendo a perguntas de desenho, processo e resultados (três em um).
Em razão disso, as primeiras avaliações participativas custaram mais, mas o custo diminuiu nas experiências seguintes. Algumas avaliações mais recentes (2024), mesmo com oficinas e estratégias participativas, não tiveram custo adicional, pois os avaliadores ofereceram essa abordagem como valor agregado, e a equipe interna já havia desenvolvido capacidade técnica para facilitar o processo.
Vale lembrar: a avaliação participativa pode ser aplicada em todo o ciclo ou apenas em fases específicas. Isso também impacta tempo e custo.
Com base em sua experiência como gestora pública, quais são os principais efeitos positivos da avaliação participativa?
Elenco aqui alguns desses efeitos:
- Geração de perguntas de avaliação mais pertinentes
- Maior uso dos resultados pelas equipes gestoras
- Agendas de melhoria mais robustas e implementadas
- Maior aceitação dos processos de avaliação
- A avaliação é vista como oportunidade de aperfeiçoamento, e não de punição
- Melhora da imagem da gestão pública perante a sociedade
- Aprendizagem coletiva entre todos os envolvidos
- Apropriação dos problemas e das soluções pelos atores
- Cocriação de soluções criativas e eficazes
- Fortalecimento de vínculos entre os envolvidos, que permanecem mesmo após o fim da avaliaçãoQuer saber mais sobre avaliação participativa? Leia nossas entrevistas com os especialistas Claudia Olavarria e Pablo Bilella, além do artigo “O que é avaliação participativa“, todos publicados em nosso blog.